A cannabis medicinal ainda carrega o peso do preconceito. Muitos pacientes chegam ao consultório com receio ou vergonha de falar sobre o assunto — e é compreensível. Por décadas, essa planta foi associada exclusivamente ao uso recreativo e à marginalização, o que obscureceu seu potencial terapêutico e atrasou pesquisas importantes. Mas é hora de olhar para a cannabis com a lente da ciência, da ética e da empatia.
Um dos mitos mais comuns é o de que o uso da cannabis medicinal “vicia”. A verdade é que o composto mais usado nas formulações médicas no Brasil, o canabidiol (CBD), não possui efeito psicoativo e não causa dependência. O tetra-hidrocanabinol (THC), por outro lado, pode ter ação psicoativa, mas também é empregado de forma terapêutica em concentrações controladas, quando há real indicação clínica, como em dores intensas, espasticidade ou náuseas induzidas por quimioterapia. O segredo está sempre na dose, na formulação e no acompanhamento médico adequado.
Outro mito recorrente é de que “é tudo a mesma coisa”: cannabis é cannabis, e pronto. Isso é um grande equívoco. Cada extrato, cada formulação e cada paciente exigem uma abordagem individualizada. Existem centenas de canabinoides e diferentes proporções entre eles, o que impacta diretamente no efeito terapêutico. O tratamento é personalizado, e não generalizado.
Também é preciso combater a ideia de que cannabis é “última alternativa” ou “tratamento sem respaldo”. Hoje, há evidências robustas sobre seu uso em epilepsias refratárias, dor crônica, autismo, transtornos de ansiedade, insônia, doenças neurodegenerativas, entre outras condições. A Anvisa regulamenta a prescrição, importação e até a venda em farmácias de produtos à base de cannabis, desde que aprovados, garantindo segurança e rastreabilidade.
No Brasil, o uso medicinal da cannabis é legal e regulamentado desde 2015, com avanços importantes nos últimos anos. Pacientes podem obter prescrição médica e acesso a produtos via importação ou farmácias autorizadas. O Conselho Federal de Medicina também reconhece seu uso, principalmente em casos específicos, como epilepsia de difícil controle. Estamos, sim, avançando — e a boa notícia é que esse caminho é irreversível.
Cabe a nós, profissionais da saúde, combater desinformações e acolher o paciente com escuta ativa e responsabilidade. O preconceito não pode estar acima do cuidado. E você, paciente, tem o direito de se informar, de perguntar, de buscar o que há de mais atual na medicina para melhorar sua qualidade de vida.
Estou aqui para isso. Para ouvir sem julgamento, avaliar com critério e, se indicado, prescrever com segurança. A cannabis medicinal não é milagre. É ciência, cuidado e possibilidade.